Tenho ouvido colegas cientistas falarem que não têm conhecimento de outra tecnologia que em tão pouco tempo causou tanto impacto na ciência, na indústria, nos governos e nos consumidores finais como a inteligência artificial (IA). Até onde meu conhecimento chega, também não sei de nada equivalente. Portanto, é importante dizer que o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA) 2024-2028 tem o mérito de simplesmente existir, reconhecendo IA como área de pesquisa essencial no Brasil.
Mas o PBIA possui muitos outros méritos. Mérito de não ser confundido com as polêmicas e ainda incertas políticas de regulamentação de IA, que têm gerado grandes preocupações nos legislativos e empresas de muitos países. Mérito de afirmar que o país não seguirá por caminhos baseados em teorias obscurantistas, que colocam os riscos à frente dos benefícios, como, por exemplo, a visão de que a IA é uma potencial geradora de desemprego em massa, de injustiças e desigualdades, entre outros. O próprio slogan do plano demonstra esse acerto: “IA para o bem de todos”, reforçando os aspectos positivos da tecnologia, e não os seus potenciais riscos.
O primeiro ponto do programa que precisa ser discutido é o valor do investimento previsto até 2028: cerca de R$ 23,03 bilhões. Podemos começar fazendo uma comparação com os gastos do governo em outras áreas. Por exemplo, o Fundo Eleitoral a ser usado para as campanhas dos candidatos nas eleições municipais de 2024 será de R$ 4,9 bilhões. Supondo que esse valor se manterá para as eleições de 2026 e 2028, o governo gastará R$ 14,7 bilhões com campanhas eleitorais no mesmo período.
Podemos também comparar com o investimento de outros países em IA. O próprio plano do governo mostra a distância que estamos da China (R$ 306 bilhões de investimentos em data centers apenas em 2024) e dos EUA (R$ 63 bilhões de investimentos públicos em Pesquisa & Desenvolvimento na área de IA de 2021 a 2024 e investimentos privados estimados em R$ 308 bilhões apenas em 2023).
A comparação mais próxima, que está sendo usada pelo governo, é com a União Europeia (UE), que lançou em janeiro deste ano um programa de financiamento dedicado à IA generativa, e prevê um investimento de 4 bilhões de euros (pouco mais de R$ 24 bilhões) até 2027. Mas esta comparação não se sustenta, uma vez que esse valor é só parte do investimento da UE. A Comissão Europeia informa que também mobilizará investimentos adicionais do setor privado e dos Estados-Membros, a fim de atingir um volume de investimento anual de 20 bilhões de euros (mais de R$ 120 bilhões).