Um selo talhado em rocha encontrado em Jerusalém pode ter provado a existência de um dos guerreiros do rei Davi citado na Bíblia. O achado foi anunciado no fim de agosto pela Autoridade de Antiguidades de Israel (IAA) e pelo Parque Arqueológico da Cidade de Davi após escavações realizadas junto à Universidade de Haifa.
Estima-se que a relíquia encontrada próxima à muralha Sul do Monte do Templo tenha cerca de 2.700 anos, o que é consistente com o período em que o Primeiro Templo ainda estava de pé na cidade. Nela, foi identificada uma inscrição em hebraico do Paleolítico que é a principal pista na direção do guerreiro.
“O selo, feito em rocha escura, é um dos mais bonitos já descobertos em escavações na Antiga Jerusalém, e foi executado no maior nível artístico”, comentou em comunicado à imprensa o Dr. Navot Rom, que divide a direção da pesquisa com o Dr. Yuval Baruch, ambos representando a IAA.
A gravação foi feita de forma espelhada e teria servido a dois propósitos, determinaram os pesquisadores: para que o dono pudesse assinar documentos e também como amuleto. Como há um corte convexo em ambos os lados e um pequeno furinho, o selo pode ter sido usado pendurado em uma corrente para usar no pescoço.
No centro, há uma figura com asas usando vestes listradas de perfil — como se vê em moedas contemporâneas, por exemplo. O retratado tem cabelos longos e usa uma espécie de chapéu ou coroa.
Além disso, há um braço levantado à sua frente com uma palma aberta, o que pode ter indicado que segurava algum objeto. Em ambos os lados, é possível ler: “LeYeho’ezer ben Hosh’ayahu”, que se traduziria em pertencente a Yeho’ezer, filho de Hosh’ayahu.
De acordo com o arqueólogo especializado em cultura assíria da IAA, Dr. Filip Vukosavovic, a figura no selo é que serviria de proteção ao homem que o carregava.
“Esta é uma descoberta extremamente rara, é a primeira vez que um ‘gênio’ [ou demônio] com asas — uma figura protetora mágica — foi encontrada na arqueologia regional de Israel. Imagens de demônios com asas são bem conhecidas na arte neo-assíria [produzida] entre o século 9 e o século 7 a.C., e eles eram considerados um tipo de demônio protetor”, afirma no texto divulgado pela organização.
Como a inscrição sugere, o dono do selo seria o filho de Hosh’ayahu (em hebraico), que era um alto oficial do Reino de Judá. Justamente por ter sido uma figura de autoridade, este pai teria encomendado o objeto com a gravação de uma criatura mítica que inspiraria admiração ou temor.
“Parece que este objeto foi feito por um artesão local, um judaíta, que produziu o amuleto sob encomenda do dono”, explicou ainda Vukosavovic.
A hipótese dos arqueólogos israelenses é que Yeho’ezer herdou o selo do pai após a sua morte — ele, aliás, é quem teria adicionado o próprio nome e o de seu pai em ambos os lados da “moeda”, provavelmente para invocar a tal proteção do amuleto para si mesmo.
“Comparando o formato das letras e do texto a outros selos hebreus e bullae (impressões de argila dos selos) de Jerusalém nos mostra que, diferente da gravação cuidadosa do demônio, a escritura dos nomes no selo foi feita de maneira descuidada. Não é impossível que, talvez, o próprio Yeho’ezer tenha gravado os nomes no objeto”, acredita o professor Ronny Reich, da Universidade de Haifa, que também esteve envolvido na pesquisa divulgada.
Ao procurar por quem teria sido Yeho’ezer ou, em sua versão abreviada, Yo’ezer, os estudiosos o encontraram na Bíblia. No Primeiro Livro de Crônicas, Yo’ezer (ou Joeser, na tradução ao português) é apresentado como um dos guerreiros do rei Davi.